Tuesday, November 15, 2005

O espião que saiu do frio - John Le Carré

Sobre o quê: Tendo como cenário a Alemanha dividida pelo muro de Berlim, um espião inglês desempenha uma complicada missão em vários países da europa. Seu nome é Alec Leamas e um dos maiores desafios de sua missão é viver diferentes personagens sem se transformar em um deles.

Crítica: Primeiro de tudo, há que se dizer que é um livro complicado. Claro, toda história que tem como pano de fundo a Alemanha, Rússia ou qualquer outro país onde mais de três consoantes juntas podem ser usadas numa palavra, exige, no mínimo, uma dose de atenção maior do leitor. As organizações têm nomes impronunciáveis, as cidades idem, mas a genialidade e o sentimento de Jonh Lê Carré nos dão forças. É tão importante saber o que se passa na confusa mente do nosso agente secreto que encaramos os nomes dos lugares mais estapafúrdios como se fossem souzas e silvas. E tome Abteilung...Na verdade, tanta complicação esconde a história mais simples da humanidade. Um cara durão, capaz de beber até não cair, capaz de apanhar até não desmaiar, capaz de mentir até não se contradizer é pego numa grande armadilha. Não pela organização rival, mas pelo seu próprio coração. Toda sua força e experiência como agente secreto não são suficientes para evitar que ele se apaixone por um bibliotecária carinhosa e pura e dócil, como todas as mulheres merecedoras de um grande amor devem ser, que, só para não perder o rumo complicado da história, é participante do partido comunista. Uma presa fácil para as organizações criminosas que se digladiam pelo poder através de seus agentes secretos. Parece cansativo e é. O livro é uma maratona com obstáculos, mas atravessei todos eles com a esperança de ser a leitora também de uma linda história de amor. O final não é feliz. É cinza como imaginamos que a vida entre as duas alemanhas num dia frio deve ser. É escuro como a noite que esconde os espiões. É amargo como a vida de quem nunca pode assumir uma identidade normal. E, talvez por tudo isso, mereça ainda mais ser uma história de amor. Não daquelas com finais felizes. Mas daquelas com finais reais.

P. S. – Coincidências - Uma: No mesmo período, assisti ao “Jardineiro Fiel” , e descobri que era também de Jonh Lê Carré, Outra: No dia seguinte, assisti “Das coisas belas e sujas” e re-assisti “Alta Fidelidade”, e descobri que os dois são do mesmo diretor, Stephen Frears. A vida vem realmente aos pares, e não é só de havaiana...entendam isso como quiserem.

Gisela Cesario

Wednesday, November 09, 2005

Mandrake - a bíblia e a bengala – Rubem Fonseca

Sobre o quê: Mandrake é um advogado criminal que já apareceu em dois livros: “E do meio do mundo prostituto só amores guardei ao meu charuto” e “A grande arte”. Agora o autor nos aproxima da vida pessoal e profissional e de Mandrake, contando suas diversas aventuras de detetive.

Crítica: Me perdoem se eu estiver errada (perdoem também esse começo ), continuo, mas esse livro não era para ser um romance, quer dizer, uma história só? Li na contracapa: “nova aventura de mistério e suspense”. Uma relação tão estreita quanto a de um livro com o leitor não pode começar com uma mentira. Senão a primeira coisa que o leitor sente é decepção. Sou fã de carteirinha do Rubem Fonseca, mas foi isso que senti quando percebi que o livro é quase um livro de contos, como as aventuras de Ed Mort. Claro que isso não desmerece em nada o livro, mas quem compra uma banana quer uma banana, por mais que goste de maçãs. Fruta por fruta, o livro também não é um abacaxi, mas precisava registrar esse fato que teria mudado minhas expectativas e conseqüentemente minhas opiniões, que é melhor eu dizer logo quais são. Vamos lá. Ninguém abre um livro do Rubem Fonseca sem um grande tesão. Como também sou fã de romances policiais, estava maravilhada com o fato de um de meus autores preferidos ter escrito um e mais maravilhada porque ele estava nas minhas mãos, pronto para ser devorado. Fui devorando até o meio quando percebi que havia uma grande divisão entre a bíblia e a bengala. São duas histórias distintas que tem o personagem principal, Mandrake, e alguns outros em comum, mas são duas e não uma como se induz o leitor a pensar. Se você compra um livro cujo nome é Romeu e Julieta, você não acha que primeiro vai ler a história do Romeu, depois a da Julieta, e, no meio da última, algumas outras. Isso doeu. E doeu mais porque é o Rubem Fonseca. Respirei fundo e me conformei. Não foi difícil porque o Mandrake é o personagem mais Rubem Fonseca de Rubem Fonseca, engraçado, cínico, amoral, o detetive por quem se apaixona todo aquele que ama histórias policiais. As do Mandrake são divertidas, mas (infelizmente) não têm a estrutura que um policial classe “A” deve ter. Principalmente a da bengala, onde há falhas que bons detetives de história de detetives certamente vão encontrar. Quer um conselho? Fique com a vida do Mandrake e esqueça os mistérios. Ele é o lado Rubem Fonseca do livro. Quer outro? Espere o próximo livro do autor e torça para que esse seja inteiramente Rubem Fonseca.

Gisela Cesario