Friday, January 27, 2006

Berenice procura - Luiz Alfredo Garcia Rosa

Sobre o quê: O assassinato de um travesti em Copacabana desperta o interesse de Berenice, taxista da área, quando um sem-teto parece estar sendo envolvido injustamente no caso. Ela, mesmo com a total desaprovação do ex-marido, que é jornalista policial, resolve investigar o caso.

Crítica: Não gosto de falar mal de gente, falar mal de livro então é pior ainda.
“Berenice Procura” começa bem (já adivinhou que aí vem bomba, né? E vem mesmo), começa tão bem que a gente desconfia. Com um ritmo incrivelmente intenso, a primeira metade do livro faz uma grande promessa que a segunda não consegue, nem de longe, cumprir. Vamos então falar da primeira parte que ela merece. Luiz Alfredo nos apresenta um personagem chamado Russo, um sem-teto que passou a vida toda nas ruas de Copacabana e, hoje, com 30 e poucos anos, conhece como ninguém não só as esquinas mas os bueiros e subterrâneos do bairro. Tanto que dorme nas galerias inacabadas do metrô. As ruas existem mesmo, as galerias também, meninos e adultos como Russo certamente existem, a gente pode vê-los a todo instante em Copacabana. Isso, pra quem mora no Rio e sabe do que o autor está falando, é certamente fascinante, não sei pra quem não conhece, mas eu, quando estava no meio do livro, quase subi a pedra onde termina a Rua Constante Ramos pra ver se tinha uma entrada para uma galeria do metrô ali. Essa é a primeira metade e um pouco mais do livro. Instigante, irresistível, pulsante e todos os adjetivos cabíveis àqueles mistérios que talvez só a Agatha Christie tenha escrito. Ou o Luiz Alfredo tinha escrito o melhor policial brasileiro que eu conhecia ou eu ia me decepcionar. Infelizmente foi a segunda opção. Perto do final, o que era um ritmo intenso se torna um atropelamento de fatos, como se diz, coisas estranhas começam a acontecer. Acho que o ponto de inflexão é quando a Berenice resolve começar a seguir o Russo e depois resolve falar com ele, ainda explicando ao rapaz seu grande medo que uma injustiça seja cometida. Isso não tem cabimento. Não vou esmiuçar os motivos, mas quem ler vai, possivelmente, concordar comigo, não tem cabimento um personagem solitário que vive na sua tomar ares de justiceiro de repente e ainda mais porque não há ameaça real alguma pairando sobre nosso anti-herói. Depois que ela tem uma noite tórrida de amor com ele no túnel inacabado do metrô, aí tudo vai pro buraco mesmo, com o perdão do trocadilho, eu não devia dizer mais nada, mas se eu disser, você acredita que o ex-marido ciumento corta com os dois lados e, talvez, tenha tido um caso com o travesti assassinado? Isso até poderia ser interessante, não fosse a aparente pressa ou desespero de terminar o livro que começa a ficar sem pé nem cabeça e termina tão abruptamente que a gente vira a página procurando o resto da história.
O autor não colocou Espinosa, seu personagem policial de outros livros, nesse romance. Ainda bem. Ele não merecia. Não acho que o autor está numa fase ruim, não acho que ele perdeu a inspiração nem nada disso. Só acho que não dá pra acertar sempre. E dessa vez, ele errou feio.

Gisela Cesario