Friday, October 26, 2007

Um livro por dia – Jeremy Mercer

Sobre o quê: Um repórter policial canadense conta sua história ( acho que verídica) de quando passou cerca de 4 meses abrigado na peculiar livraria Shakespeare and Company em Paris.

Crítica: O título é, no mínimo, enganador. Ele dá a idéia de que haverá algum obstáculo a ser transposto ou algum prazer a ser deleitado diariamente. Ele dá a idéia de que existe um enredo, sabe aqueles pressupostos de uma história: situação inicial, conflito, resolução, situação final, mais ou menos isso.
Se eu tivesse renomear essa obra, chamaria “Deus, me dê paciência”. Claro, há alguns elogios que devem ser feitos. Vamos a eles que vai ser rápido. O texto é bem escrito, as descrições não são entediantes, o autor consegue despertar nossa curiosidade sobre a livraria, e qualquer leitor gosta de livraria...aí acabou. Viu como foi rápido? Incrivelmente, um bom escritor falando de uma boa livraria não conseguiu escrever uma história.
Vejam bem, não é questão de julgar se a história é boa ou ruim, a história não existe. Nada acontece. No começo, a descrição da livraria e dos dias parisienses é bem agradável. O problema é que essa sensação agradável é justificada não só pelo bom tom do texto, mas pela antecipação da boa história que está por vir, está por vir, está por vir e não vem nunca. Só quando faltavam umas 50 páginas pra terminar foi que me dei conta que nada jamais aconteceria, ou todos os dias aconteceriam coisas banais e nenhum evento seria o propulsor de algo digno de ser chamado de romance de qualquer tipo.
Claro que tudo deriva da expectativa. Se você compra um livro chamado “diário de viagem” , você não espera um fio da meada que conduza a um gran finale. Justiça seja feita, o subtítulo do livro é “minha temporada parisiense na shakespare and company”. Talvez a culpa tenho sido mesmo minha de esperar algo de mais. Sinceramente nunca imaginei que a temporada parisiense dele pudesse ser tão chata (desculpem, mas essa é a palavra). O livro se resume em contar que o dono da livraria é um intelectual comunista com ideais de liberdade e sociedade louváveis, que a livraria , além de servir de albergue para escritores, é desorganizada e suja, que os moram lá são pessoas perturbadas em busca de algo que não sabem o que é e que o autor é uma dessas pessoas. Como isso não é exatamente muita informação, o autor nos conta esses fatos nas primeira 10 ou 20 páginas. Depois só nos resta ler a mesma coisa pelas outras 250 páginas que sobram.
Há um certo orgulho em conseguir terminar. Não é pra qualquer um. Até porque, não é um livro por dia, mas a mesma história todo dia. Minha recomendação: não tente fazer isso em casa.
Gisela Cesario

Wednesday, October 24, 2007

Mente Assassina – P.D. James

Sobre o quê: Um assassinato numa clínica psiquiátrica famosa de Londres coloca médicos e outros funcionários sob suspeita. Para desvendar o mistério, é chamado o inspetor Adam Dalgliesh.

Crítica: Como dizia aquele nobre filósofo, “de onde menos se espera é que não sai nada mesmo”. Talvez se eu tivesse esperado menos, claro, minha decepção teria sido menor. Mas como esperar pouco de um enredo desses? Londres, clínica psiquiátrica, médicos e loucos se misturando, assassinos, um inspetor frio, noites frias, neblina. Tenho a impressão que até a mãe do Romário de cadeira de rodas faria um gol desses, né não?
Infelizmente, PD James bateu pra fora e perdeu a chance de usar todos os elementos de um clássico de suspense para fazer um clássico de suspense.
Basicamente, a história é arrastada, apesar, mais uma vez apesar, de todos os elementos necessários para ser dinâmica. Os eventos não são encadeados, os personagens se movem num ambiente aparentemente sem gravidade, seus atos parecem não surtir efeito. O próprio inspetor não diz ao que veio, não assume personalidade alguma, inicia um romance com uma personagem que simplesmente desaparece da história ( bem fez ela).
Não é preciso entender muito de literatura para saber o seguinte: o mínimo que um suspense deve fazer é despertar sua curiosidade para o final. Em Mentes Assassinas, há excesso de brumas, aliado à chata mania de colocar nomes parecidos em personagens que nos confundem, tudo isso numa estrutura média, o livro não chega a ser ruim. Não é um texto que nos faz sentir raiva e vontade de joga-lo na parede. O problema é que ele desperta uma expectativa que jamais é satisfeita. Mas para matar a esperança de um leitor de mistério só no final mesmo, porque a gente sempre espera uma reviravolta de duas páginas pelo menos, algo que vai nos compensar por tanto lenga lenga. Bom, em Mentes Assassinas essa esperança morre também junto com as outras mortes do fim do livro. Nada que surpreenda alguém. Nada que justifique alguma coisa. Ao que tudo indica, PD James é uma escritora competente que, pouco inspirada, usou uma fórmula básica como alternativa à criatividade, por isso gerou uma obra oca, sem o conteúdo que fizesse jus à sua aparência de bom mistério.
Acho que isso pode se chamar de contar o final do livro. Mas tudo bem, nesse caso, não vale a pena nem começar.
Gisela Cesario

Tuesday, October 23, 2007

Todo mundo que vale a pena conhecer - Lauren Weisberger

Sobre o quê – Ela trabalha no UBS, um conhecido banco de investimentos, e tem um função considerada pouco glamourosa no universo feminino: atender a investidores descontentes, garantindo que a melhora dos seus rendimento é só uma questão de tempo. Ela está insatisfeita e, no meio de uma discussão com seu chefe, lhe escapa da boca um pedido de demissão. Pronto. É o início de uma nova vida onde ser fútil não é fútil, é básico.

Crítica: Lauren provou que tem talento ao escrever “O Diabo veste Prada”, nunca é demais lembrar o quanto o livro é enérgico, hilariante e pertinente. Ao escrever “Todo mundo que vale a pena conhecer”, Lauren provou que é um ser humano, ou seja, está sujeita a falhas.

A última obra da autora está longe de ser tediosa, o ritmo, ainda que tenha se tornado mais lento, continua frenético o suficiente para fazer 300 páginas parecerem 30. As situações engraçadas também estão longe de serem sem-graça, o texto continua fazendo o leitor rir sozinho com cara de pateta para quem está olhando. Porém, contudo, entretanto...O livro também está longe de ser tão bom quanto o primeiro. Errar é fácil. Todo mundo sabe como acontece. Os problemas são solucionados rápido demais, situações inverossímeis assumem ares de gran finalle, a contagem do tempo parece estranha. Finalmente, alguma coisa nos dá a impressão de baboseira. Deixando minhas considerações sobre o termo “literatura feminina” e suas implicações de lado, toda mulher quer um príncipe encantado, porém se ele estiver barbeado demais, se o cavalo for branco demais e se o castelo brilhante de doer, fica tudo meio chato...Filosoficamente, todas queremos ser barbies mas nenhuma de nós quer transar com o idiota do Ken ( ou seria Bob?)

O que estou tentando dizer com esse festival de metáforas é que a autora começou escrevendo um libelo contra repressão de empregos chatos e terminou num conto de fadas. Sempre gosto de deixar claro que, quando escrevo sobre um alguém de quem já li algo, comparo a pessoa com ela própria. Comparada a qualquer outra autora comum, Lauren teria escrito um ótimo e divertido livro. Comparada a autora de “O Diabo veste Prada”, ela produziu um esboço de piadas boazinhas numa narrativa leve, doce e gostosa. E, talvez no esforço de continuar assim, o final tornou-se doce demais até ficar enjoativo.

Há que se admitir, entretanto, que a Weisenberg conhece a alma feminina e sabe lidar com ela. Por isso, e apesar de tudo que escrevi acima, reconheço que somos seres cheios de contradições e recomendo o livro a quem estiver a fim de umas boas risadas.
Gargalhadas mesmo, creio e espero, vão ficar pro próximo.

Gisela Cesario

Friday, August 24, 2007

Almost Blue – Caco Lucarelli

Sobre o quê: De diferente formas, três personagens estão envolvidos numa série de crimes. O assassino, um psicopata que troca de identidade a cada vítima. A detetive, que luta contra a solidão que a persegue e pra ter seu trabalho reconhecido. E um cego que passa os dias ouvindo um tipo de rádio amador. Ele é, por acaso, o único capaz de reconhecer o criminoso.

Crítica: Todo leitor acredita que existe uma força superior que o une aos livros. Algo como o destino que rege os encontros amorosos. Às vezes você caça, outras é caçado. Pois algumas vezes os livros escolhem o leitor, e não ao contrário.

Almost Blue jamais esteve na banca das novidades, nem dos mais nem dos menos vendidos (devia existir isso). Entretanto, em cerca de 6 meses o escolhi (aleatoriamente?) em estantes de lugares completamente diferentes como a biblioteca de um curso, um sebo e uma livraria. O lagarto na capa verde e azul, o nome em inglês de um autor que eu pensava que era brasileiro...alguma coisa me chamava naquele livro. Um dia entrei numa livraria e fiquei procurando, só de sacanagem foi a única vez que não o vi. Aí decidi que quem mandava no meu destino era eu, fui até o vendedor, pedi o livro, ele demorou a ser encontrado (Caco Lucarelli é italiano – era meio óbvio, né?), finalmente eu comprei. Mas chega de falar de mim.

Almost Blue. Cheguei a procurar no dicionário uma palavra, que eu não consigo encontrar na minha cabeça, pra adjetivar esse livro. Podia ficar aqui com fantástico, chocante, surpreendente, lancinante, certeiro, sei lá mais o quê. Não sei como descrever nem sei como alguém conseguiu escrever um livro tão cinematográfico ( será que encontrei a palavra?). Pela primeira vez tive a sensação de estar vendo um filme de ação enquanto lia um livro. Não por acaso, o autor é colaborador de Roman Polansky.

Não que eu seja muito fã de filmes de ação, mas é diferente quando as cenas acontecem dentro da sua cabeça. Claro que a linguagem é frenética, você vira as páginas sem perceber, mas o mais instigante é mudança da pessoa do narrador. Sei que essa expressão parece ter saído de uma aula de teoria literária, mas eu não estou fazendo uma referência gramatical. Acontece que a história é contada por um narrador ausente quando fala da detetive, pelo cego e pelo assassino simultaneamente. E o assassino é um cara doido que não sabe quem é. E você é um leitor doido que não sabe quem está falando, se é o cego ou o doido, porque o cego também não bate muito bem. Como num jogo de videogame, você tem que ficar atento o tempo todo pra não se perder.

Isso poderia ser horrivelmente chato e fazer você desistir de ler se não fosse feito do jeito certo, como uma comédia que tem o tempo exato pra platéia rir, o suspense não chega a deixar você tonto a ponto de perder o interesse. De alguma maneira sobre humana, Caco consegue fazer a revelação na hora certa do suspense máximo.

Cada descoberta de narrador traz ainda uma novidade pra história, as peças do quebra-cabeça vão se completando até chegar num final poético. Agora o adjetivo é esse mesmo. É como enxergar uma praia paradisíaca após de ter sobrevivido a um naufrágio. Depois de um puta exercício aeróbico, seu cérebro vai relaxar e gozar nas últimas linhas. E linhas é uma palavra tão limitada. Melhor seria dizer últimas cenas. Cenas de um daqueles filme que deixam a gente com cara de babaca fingindo ler os créditos, sem forças pra levantar e ir embora do cinema.

Gisela Cesario

Wednesday, June 06, 2007

Os amigos do crime perfeito – Andrés Trapiello

Sobre o quê: Um grupo de amigos aficcionados por romances policiais se reúne para filosofar sobre o crime perfeito. Isso até que um verdadeiro assassinato se encarregue de mostrar as diferenças entre a realidade de um crime e a filosofia das discussões deles.

Crítica: Graças a Deus acabou. Sei que isso não é a melhor maneira de começar uma crítica, mas o nome desse livro bem poderia ser “os inimigos do crime perfeito”. Antes de entrar no mérito que me leva a ser tão cruel, vamos dar os créditos justos e necessários ao autor.
Andrés Trapiello tem um ótimo texto, ao mesmo tempo ágil e suave. De outra maneira, sinceramente eu não teria conseguido chegar ao final do livro.
É como colocar um ótimo ator num filme sem roteiro, ele tenta em vão salvar uma história, mas a única emoção que consegue despertar é a pena pelo desperdício do seu talento.
As palavras do nosso autor gritam, choram, sussurram, usam de todos os artíficios, mas não conseguem fazer de “os amigos do crime perfeito” um livro bom. A história não existe, o foco muda constantemente, o leitor fica perdido sem saber em que acontecimentos prestar atenção. Há muita informação, e nenhuma delas parece ter alguma relação uma com a outra.
Paco Cortez, o personagem principal, é um escritor, ele resolve deixar de escrever e voltar pra sua mulher. E daí? Isso é relevante? Não se sabe. Sua mulher é filha de um policial corrupto e alcoolátra. Tá...Um dos participantes dos ACP ( Amigos do Crime Perfeito) é apaixonado por uma viciada em heroína cujo ex-marido vive aparecendo., E o tal do crime, fator, diria eu fundamental, a um romance policial, só acontece depois de umas 250, isso mesmo 250 páginas de nem sei o quê.
Mesmo após o crime, vemos que uma série de lebres foi levantada e permaneceu lá no alto, esquecidas lebres coitadinhas.
Ainda ajuda o leitor insone a evitar tranquilizantes, o fato de cada um dos participantes do ACP ter um pseudônimo. Paco por exemplo é Sam Spade, tem o sherlock hommes, o Nero Wolfe. Quer dizer que além de decorar um monte de histórias soltas e complexas, o pobre leitor ainda tem que lembrar de cerca de 10 nomes para 5 pessoas. Haja memória.
Claro que as coisas melhroram quando, por volta da página 300, alguma campainha toca e faz lembrar que aquilo é um romance policial, gente tem que morrer, gente tem ser investigada, motivos, assassinos, essas coisinhas básicos. Como aí faltam só umas 50 páginas para o fim do suplício, nosso autor sai correndo e consegue juntar algumas pontas daquelas histórias que estavam perdidas por aí. Pessolmente, minha vontade de ler a última linha e fazer outra coisa qualquer era tão grande que nem liguei muito.
Só um último aviso: se você deseja recomendar esse livro a alguém, não o faça a quem, como eu, é amiga de um crime perfeito.

Tuesday, January 30, 2007

A décima Segunda noite – Luis Fernando Veríssimo

Sobre o quê: A adaptação da obra de Shakespare tem como narrador o papagaio Henri. Ele vive num salão em Paris e precisa relatar a um gravador a história que presenciou. Uma complicada trama de contrabando em imagem de santos onde todo mundo se apaixona, inclusive o papagaio.

Crítica: Veríssimo é, desde sempre, um escritor genial. O mínimo que se pode dizer sobre seu romance é que faz juz à genialidade e à fama do autor. Como se fosse um ginasta consagrado que, mais uma vez, nos deixa fascinados com um salto perfeito.
É um livro para ser lido numa tarde se você não for como eu. Tenho muita pena de devorar um texto desses de uma vez só, porque sei que não existem muitos veríssimos por aí pra eu ler depois.
Assim, tentei ir o mais devagar possível, porém “A décima Segunda Noite” exige uma certa agilidade. São muitos personagens, a história é frenética, o rimto da narração é intenso e o papagaio está nervoso.
Quando terminei a leitura lenta, decidi ler tudo novamente, mas de um fôlego só. E foi ainda melhor. Veríssimo escreveu um filme, daqueles que não se deve parar no meio.
Henri não é só o único papagaio que conversa, ele também se apaixona. E, sofre, do seu poleiro, com as aventuras de sua amada. Mas a delicada alma de Henri não só está aprisionado em um corpo de papagaio, como também padece pelo fato de suas penas serem cinzas. Por isso, sua dona o cobre constantemente com camadas de tinta verde e amarela que ressaltem sua origem brasileira e o façam ser atração do salão. O problema é essa tinta também sufoca nosso narrador, que, por medo de não sobreviver a essa intoxicação, tem pressa de contar tudo. Claro que todos os leitores do Veríssimo gostariam que o papagaio continuasse falando por muitas páginas e páginas. Afinal, uma ave assim é coisa rara. Rara como um Veríssimo.

Gisela Cesario

Tuesday, January 16, 2007

Cassino Hotel – André Takeda

Sobre o quê: João Pedro é um guitarrista que namora uma cantora adolescente, líder de banda em que ele toca. Justamente no seu aniversário de 30 anos, a imprensa descobre o passado dele com álcool e drogas. Sob a ameaça de destruir a carreira da namorada, ele é obrigado a abandoná-la e reencontrar personagens do seu passado numa remota praia do Rio Grande do Sul.


Crítica: Tudo ia bem até que...Essa frase interminada bem poderia resumir tudo que vou dizer nessa crítica. A verdade é que não dá pra perceber direito quando o autor decide parar de escrever um romance e começar a escrever tudo que lhe der na telha, encontrando espaço inclusive pra conversar com o leitor, que, falo por mim, não estava a fim de papo e sim de saber o que ia acontecer.
Explico: O texto começa legalzinho, se dá pra lembrar que o autor é iniciante,essa lembrança se dissipa quando ele consegue voltar nossa atenção exclusivamente para a história de Jõao Pedro que reencontra a ex-namorada numa volta forçada ao sul do Brasil. Ela está casada com o melhor amigo dele e, para sua surpresa, ele descobre que seu rival ficou cego. Interessante, não é? Você quer saber o que vem depois? Desista. Depois não vem nada, o autor se perde e a gente fica tentando encontrá-lo até o fim do livro.
Com todos os personagens na praia de Cassino, a ex-namorada,o melhor amigo cego,o pai de João Pedro e até a namorada adolescente, o clima é daqueles filmes americanos de grandes revelações no natal da família mac gregor. Isso, todos sabemos, pode resultar em uma imensa xaropada ou numa história emocionante. Aqui não acontece nem uma coisa nem outra. Num certo momento do livro a gente se sente no meio de uma liquidação “o patrão ficou maluco”.
Faço questão de transcrever um pequenino trecho: “Então, largue esse livro de uma vez e cale sua boca no beijo de alguém..” Isso foi na página 143, eu não segui o conselho do autor e continuei até a 192 que onde o livro acaba. Veja bem, o livro, não a história. Essa, se é que alguma história foi contada, acaba algumas páginas antes. O que vem depois são dois apêndices. Por favor, não estou brincado. Nesses apêndices, temos reveladas as fontes de inspiração do autor, como diabos ele fez para escrever essa maravilha, inclusive qual música foi a trilha sonora do último páragrafo.
Realmente, é um livro inesquecível, pode-se acusar esse André de tudo, menos de modéstia. Além do trecho que transcrevi, muitos outros têm simplesmente a função de nos provocar, dizer que você caiu numa armadilha e vai ter que conversar com alguém que você não tem a menor idéia de quem seja. Mas se você vir Cassino Hotel numa livraria, faça o que eu devia ter feito e dê ouvidos ao que esse alguém diz: “largue esse livro de uma vez”.

Gisela Cesario

Monday, January 15, 2007

A última sessão de cinema – Larry Mc Murtry

Sobre o quê – Sonny passa de adolescente a adulto em uma pequena cidade do Texas. Um lugar onde parentes, amigos e vizinhos se confundem. Assistir a filmes no único cinema da cidade é uma das poucas opções de lazer.

Crítica – Todo mundo já ouviu falar desse filme, tanto que talvez nem precise ver pra saber como é. Uma espécie de cine paradiso americano. Mas, como as palavras tem sempre algo a mais a nos dizer do que as imagens, achei que deveria buscar minha avaliação de a última sessão de cinema no livro que deu origem ao filme.
É uma daquelas obras que, pela linguagem cinematográfica, parece predestinada a virar filme. Mesmo sem ser excessivamente descritivo, as paisagens tornam-se claras e vivas a cada página. É possível sentir o vento seco no rosto, o ar irrespirável, mistura de deserto e solidão, que atinge os personagens.
Envolvente como uma novela, não é daqueles livros que a gente não consegue largar porque precisa saber o final. Na verdade, seria até bom se o final não chegasse. Se a adolescência de Sonny, os seus casos amorosos, os porres com os amigos, tudo isso durasse para sempre.
Claro, a última sessão de cinema é o fim do sonho e o ínicio da realidade que a vida adulta representa. A história de Sonny não é diferente da de qualquer jovem, viva ele em Talia, Nova Iorque ou Bangadlesh. Ele é apaixonado pela namorada do melhor amigo, que só é apaixonada pela própria beleza, que tem uma mãe alcoolátra, que já foi namorada de um cara legal, que hoje é um velho triste, dono do único salão de sinuca, que é onde todos se encontram. Sonny também tem um caso com a mulher do treinador de futebol, que é um homossexual enrustido, cuja esposa insatisfeita se satisfaz pela primeira vez com a traição. Enfim, a cidade de Sonny poderia ser a cidade de qualquer um.
Vista pelos olhos do adolescente, Talia é o mundo inteiro, sábado à noite é o único momento que importa, a cerveja que ele está bebendo jamais vai terminar, o filme nunca terá um the end e o beijo da garota que está com ele vai continuar até que o universo se dissolva.
Talvez por isso, o livro dá a impressão de não acabar. Não há um final como um destino reservado para cada personagem. É como se a câmera fosse se afastando e depois da útlima página a gente simplesmente não conseguisse mais ver a cidadezinha nem o que está acontecendo com o Sonny.
Quando estamos num lugar que parece parado no tempo, a ilusão da eternidade toma ares de realidade. O texto de Larry McMurty faz a gente sentir esse gostinho novamente, o gosto daquela bala de hortelã que ficou perdido em algum filme da adolescência. Uma sessão de um cinema que a gente não lembra o nome porque ninguém nos avisou que seria a última.
Gisela Cesario