Friday, May 29, 2009

Lembra de mim? – Sophie Kinsella

Sobre o quê: Uma mulher acorda de um acidente sem lembrar coisa alguma dos últimos três anos. Justamente a época em que sua vida mudou por inteiro. Ela se tornou diretora da empresa, casou, reformulou seu visual, ganhou milhões e simplesmente não tem idéia de como isso tudo aconteceu.

Crítica: Lembram de Becky? Claro que foi pensando na estrela do consumo criada pela autora que agarrei com todas as forças esse romance e arranquei-o da prateleira da livraria. O último livro de Sophie, sobre a irmã de Becky, apesar de seu toque magistral, não tem o brilho característico que a personagem Becky merece. Pois bem, Becky reencarnou em Lexi, a protagonista de “Lembra de Mim”, e reassumiu seu brilho original.
É certo que falam em diversas fórmulas para o escritor se manter em sucesso, entre elas dar férias a seus personagens de vez em quando, partir pra outra, digamos assim. Parece que foi isso que Sophie fez: apagou aquele conturbado passado de Becky, que, convenhamos, não é um ponto de partida fácil para história alguma, e olhou para uma página em branco. Talvez essa tenha sido exatamente a idéia da autora ao criar uma personagem com amnésia, o branco total, começar do zero mesmo.
O resultado foi que nasceu de novo a personagem brilhante feminina, tenha ela o nome que tiver. Importa mais que essa mulher seja fiel a cada um dos leitores (me recuso a falar em literatura feminina) do que seja fiel a um passado de ficção que nem sempre contribui para um bom desdobramento. Penso que,se forem como eu, os leitores de Sophie não estão apaixonados nem por Becky, nem por Lexi, mas pela pessoa um pouco desastrada, assustadoramente comum e surpreendentemente maravilhosa que surge em todos nós quando rimos, ou melhor, gargalhamos, com as aventuras da personagem.
Em plena forma do desastre, a desajeitada Lexi se depara com uma linda mulher no espelho e um marido primoroso em casa. O que fazer quando tudo parece tão perfeito? Descobrir falhas, claro! Um amante, amigas invejosas, família em crise, colegas de trabalho trapaceiros e um cabelo cada dia mais sem brilho vão lembrando a nossa desmemoriada de que nem tudo é o que parece. Ou que a grama do vizinho só parece mais verde até você se tornar o próprio vizinho ou que pimenta nos olhos dos outros é refresco ou sei lá o que mais. Sei apenas que é frenético e engraçadíssimo, 200 e poucas ( ou teriam sido 300...) que parecem ter sido lidas em 2 minutos. O mesmo texto ágil de sempre com o conteúdo hilário renovado.
Eu já disse o quanto eu ri?
É claro, eu lembrei da personagem anterior, como o título ( suspeito eu) cismava em sugerir, mas muito mais lembrei do quanto é importante rir da própria vida e do quanto são maravilhosas as história de Sophie Kinsella.
Gisela Cesario

Tuesday, May 12, 2009

Desculpem, sou novo aqui – Carlos Moraes

Sobre o quê: Estamos nos anos 70. Um ex-padre, que havia sido preso por razões políticas, sai da cadeia e vai para São Paulo decidido a começar uma vida teoricamente normal.

Críticas: Vou adiantando de cara que só tenho coisas boas a dizer do livro, então vamos ao único “senão”. Pelo que entendi, o livro foi lançado agora (2009) e o autor, que também é ex-padre e ex-preso, já havia lançado outros com assuntos parecidos, então, não sei se por loucura da minha perturbada cabeça de leitora, cismei que a história era atual até começar a me espantar com algumas referências, principalmente à facilidade de se arrumar um emprego. Bom, falha minha. O livro trata da época de 70, uma daquelas épocas que a gente sente saudade mesmo sem ter vivido, pelo romantismo dos cigarros que não eram ícones do câncer, da dignidade da profissão do redator (seja de propaganda ou de jornal), essas coisas que o progresso leva embora.
Mas nada disso tem a ver com a história.

Quando comecei a ler esse livro, pensei que uma leitura pode nos trazer o esperado, o inesperado ou as duas coisas.

“Desculpem, sou novo aqui” nos traz as duas coisas. O esperado quando se conta que um ex-padre vai começar a viver como uma pessoa mundana ( leia-se pessoa do mundo, sem tom pejorativo) é que ele seja alvo de piadinhas por parte dos colegas de trabalho, seja olhado como um allien por ter feito um voto de castidade, seja alvo de enorme curiosidade por parte de todos, pois padre muitas vezes nos parece alguém entre o ser humano e Deus. O personagem de Carlos Moraes passa por tudo isso, por todos os primeiros alguma coisa de uma vida (de novo) mundana, principalmente os códigos, os quais ele faz questão de repetir que não entende. Então, do alto da nossa experiência comum, sorrimos por dentro para reconhecer com quantos inúmeros e aparentemente indecifráveis códigos convivemos o tempo todo, desde uma buzinada ao motorista da frente, a um sorrisinho com segundas ou terceiras intenções.

Bom, visto o esperado, vêem as surpresas. Todas deliciosas. Talvez a melhor delas seja a matéria onde o ex-padre tem que dizer “jornalisticamente” quem foi Jesus Cristo. Se as declarações de amor a Deus podem ser feitas de muitas formas, o autor certamente nos mostra uma das mais originais e agradáveis. Ele fala ( me arrisco a dizer que há semelhança com a santíssima trindade) de três maneiras de ver Jesus, como se Ele de letra maiúscula pudesse na verdade ser muitas pessoas, pois cada um vê com seus próprios olhos, ou seja, à sua maneira.

Destaquei esse ponto, mas a obra não tem nada de religiosa ou tem tudo pra nos mostrar que não há coisa alguma que não seja religiosa. O próprio autor diz que suas grandes devoções são Jesus Cristo e o Corintians, então espere um pouco de futebol também.

Mas, sobretudo, espere rir muito, pois o texto de Carlos Moraes é brilhante. Fluindo tranqüilamente nos leva a verdadeiras gargalhadas com suas ironias e metáforas. Quer dizer que você não vai conseguir ler de uma vez só, pois vai ter de parar várias vezes para retomar o fôlego, seja por um aperto no peito, uma intensa risada ou uma gostosa cosquinha na alma.

E agora que eu já falei do esperado e do inesperado, tenha certeza que ainda sobrou muito pra você descobrir em “Desculpe, eu sou novo aqui”. Há mais coisas entre textos como esse e o leitor do que supõe nossa vã sabedoria. Pois Deus sabe o que faz, Carlos Moraes sabe o que escreve e quem não leu não sabe o que está perdendo.
Gisela Cesario