Tuesday, March 20, 2012

A mulher de preto- Susan Hill



Sobre o quê: Numa noite de natal, em alguma linda e aconchegante cidadezinha da Inglaterra, uma família se propõe a fazer uma brincadeira aparentemente comum em lugares como esse. Reúnem-se em volta da lareira e começam a contar história de fantasmas. O único que não gosta da brincadeira é o homem da casa, e o motivo tem a ver com uma estranha mulher de preto.

Crítica: Um dos primeiros mandamentos da vida, possivelmente após não matarás, é que não devemos julgar um livro pela capa. No entanto, mais difícil que não cobiçar o homem da próxima, é se abster desse tipo de julgamento.

Entender é fácil. No momento anterior ao segurar um livro, em que se pode pelo menos ler a orelha, o que se vê é a capa, claro. É a capa que atrai o leitor, junto com o título. Todo leitor julga primeiro pela capa, segundo pelo título, terceiro pela orelha e resumo, depois, se for uma pessoa consciente, lê algumas páginas antes de investir seu dinheirinho. É claro que outros fatores influem conhecer o autor ou o fato de o livro ter virado filme. Pronto, cheguei. Nesse dia, em que comprei “A mulher de preto” eu estava disposta a assistir o filme originado pelo livro, mas a sessão era num horário horrível e num cinema bem longe de mim.
De manhã, ainda com o jornal na mão, pensei que eu ia esperar o DVD. Depois, assunto devidamente esquecido, entro na Travessa, sempre ela, e está lá. “ A mulher de preto”. Agora chega a vez da capa. Não fosse tudo que eu já disse antes, a capa teria me feito desistir. Parece que essa edição foi feita na fábrica de livros para pessoas idiotas ou pré-adolescentes ou ambos. É preta, com jeito de folhetim, tem uns olhos azuis imensos de um homem, que nada dizem da história, e um aviso do tipo “cuidado, você vai se arrepiar”, junto aquelas frases estilo “ uma história eletrizante do início ao fim”. Ah, bom, porque se fosse eletrizante só até o meio...

Ok, isso não tem nada a ver com a história. A capa é uma grande injustiça à história e só corrobora o mandamento que diz “não julgarás o livro pela capa”. Fiel, ignorei as advertências ridículas e parti pra primeira página. Logo nas linhas iniciais, dá pra perceber o tom absolutamente altivo da autora, que nitidamente está se lixando pra quem fez, está fazendo ou fará a capa. No segundo parágrafo, um leitor razoavelmente experiente já pode deduzir que ali existe uma promessa de preciosidade disfarçada de bobagem.

O texto, apesar de bastante descritivo, contém apenas o material suficiente para ambientar o leitor e trazê-lo do verão carioca para o inverno numa distante vila de um distante país onde neva, venta e a neblina é intensa.

O resto é uma narração tão bem desenvolvida que não se percebe o limite entre uma coisa e outra, num momento você é abduzido para dentro do livro, depois começa a passear junto com o personagem principal e vivenciar todos os seus sentimentos.

A história se passa antes da metade do século passado, o que torna o frio mais frio ainda. Nosso personagem narrador é Arthur, um senhor de idade, no segundo e feliz casamento, com uma enorme família numa casa de campo daquelas em que se imagina um boneco de neve no quintal.

Ele está feliz, aquecido e é noite de natal. Todos se divertem, comem, bebem e decidem que nada deve ser perfeito. Por isso, resolvem contar histórias de fantasmas. Isso definitivamente termina com a calma do nosso narrador. Adeus noite feliz, olá noite assombrada. ( Acho que esse título tem tudo a ver com a capa.)

A brincadeira provoca uma viagem num tempo literalmente enterrado, quando o narrador, ainda um jovem advogado, vivendo numa Inglaterra provavelmente mais úmida e lúgrube, precisa analisar os papéis de uma cliente que acabou de morrer. O problema é a que essa senhora morava num lugar chamado “ A casa do brejo da enguia”. Juro que não foi o cara da capa que inventou isso.

Tudo soa assustadoramente verdadeiro e sincero. Em linha alguma se percebe um tom divertido de uma história de fantasma. O negócio é sério e o bagulho é doido. Tanto que o advogado, tão racional, começa a se impressionar com o que parece uma concretização do absurdo.

Agora, se eu continuar, vou estragar uma das melhores histórias de suspense que meus raros leitores podem ter nas mãos. Li em menos de três dias e terminei bem no meio de uma madrugada.

Racional como o advogado do livro, pensei que era ridículo ter medo de ler uma história de terror durante a noite. Já li trocentos livros assim. Terminei às quatro e meia e só consegui dormir depois das seis. O pior é fiquei realmente arrepiada com o final. E percebi isso enquanto olhava o aviso idiota na capa. Confesso, idiota fui eu de não acreditar. Principalmente na única madrugada de frio e chuva do verão.
Então, minha dica é a seguinte, enquanto o filme não vira DVD, não se deixe assustar pela capa. Muito melhor é se assustar com a história.

Gisela Cesario