Sobre o quê: Um cara com uma vida pouco interessante
descobre que tem uma doença terminal e acaba entrando sem querer na vida de uma
jovem mãe solteira. Os dois são descendentes de estrangeiros, vivendo em Chicago,
e começam a descobrir que algumas desgraças podem ser boas coincidências.
Crítica: A vida não é justa.
Por que? Não sei. Por que estou dizendo isso? Porque li mais de dez livros
entre a última resenha e esta que escrevo agora, pelo menos a metade foi bem
impressionante, Hanói não foi o melhor, nem o mais bem escrito, mas talvez
tenha sido aquele com o qual eu mais me identifiquei, por isso é sobre ele que
estou escrevendo. Ou isso, ou a vida realmente não é justa.
Essa introdução maluca, que
parece sem pé nem cabeça tem muito a ver com o livro de Adriana Lisboa. David,
o personagem central, que descobre ter poucos meses de vida, simplesmente não
sabe o que fazer do tempo que lhe resta. Talvez por isso acabe, sem querer,
mudando a vida de alguém que ainda tem muito tempo.
Ele começa um romance com
uma descendente de vietnamitas chamada Alex, que trabalha num mercado. Ele
mesmo é descendente de mexicanos e brasileiros e também tem o que costumamos
chamar de uma profissão banal, trabalha em construções, sem nenhum traço de
realização profissional.
Mas é justamente o modo de
olhar para as banalidades da vida que fascina na história de Hanói. As pequenas
e aparentemente indiferentes coisas nos unem muito mais que nossos grandes
feitos.
Por mais importante que
alguém seja, ele terá muito em comum com o resto da humanidade, terá medo,
sono, fome e todos aqueles sentimentos que costumam nos reduzir a nossa eterna
insignificância.
Os personagens de Adriana
são invisíveis nas suas vidas sem graça, são iguais a milhares numa multidão.
Porém, ao dar um close na vida de alguns desses seres, Adriana nos aconchega,
acho que essa é palavra, na sua narrativa.
Estamos em casa quando
percorremos as expectativas e frustrações de todos, as mesmas que achamos ser
somente nossas.
É bom e reconfortante de
repente estar em outras pessoas, nos ver em vidas distintas e tão similares.
Viver a vida do outro sempre parece atraente, nem que seja só pela diferença.
Pensando dessa forma, o
nosso personagem principal decide, pro seu final de vida, realizar o sonho da
nova namorada, ir para Hanói, uma cidade onde nunca esteve, da qual não tem
nenhuma referência, nem motivo algum pra querer estar lá.
Alex, a descendente de
vietnamitas, ainda tenta dissuadi-lo, pela longa viagem, a língua
incompreensível e absoluta ausência de atrativos que Hanói teria para ele, como
se aquela cidade tivesse apenas um valor sentimental, impossível de ser
calculado por alguém “de fora”.
Só que viver outra vida é
tudo que David quer pra sua despedida do mundo, outros sentimentos, ser um
pouco de alguém que ele não conhece, e a maneira de fazer isso é realizando o
sonho dessa pessoa, imaginando que impacto isso poderia ter na sua realidade.
É claro que a verdadeira Hanói
não existe, nem pra ele, nem para Alex, nem para ninguém, a verdadeira Hanói é
uma ilusão de um lugar onde tudo estava certo, onde as banalidades eram
importantes e a vida era perfeita.
Assim, não ir ao encontro
dessa cidade é maneira de preservá-la da verdadeira cidade, de mantê-la no
pedestal do paraíso. Para não estragar um sonho, precisamos ter o cuidado de
não tentar transformá-lo em realidade.
Nisso parece consistir o
sentido da vida que Hanói nos apresenta, na delicadeza de embalar ideais,
cuidar deles com esmero, cultivar como se fossem delicadas plantas, acariciar
como se fossem pequenos objetos de cristal, os quais um vento de realismo pode
destruir em um segundo.
Não vou contar o final de
Hanói, até porque, depois de tudo que eu já disse, é óbvio que Hanói não merece
ter fim.
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