Tuesday, May 12, 2009

Desculpem, sou novo aqui – Carlos Moraes

Sobre o quê: Estamos nos anos 70. Um ex-padre, que havia sido preso por razões políticas, sai da cadeia e vai para São Paulo decidido a começar uma vida teoricamente normal.

Críticas: Vou adiantando de cara que só tenho coisas boas a dizer do livro, então vamos ao único “senão”. Pelo que entendi, o livro foi lançado agora (2009) e o autor, que também é ex-padre e ex-preso, já havia lançado outros com assuntos parecidos, então, não sei se por loucura da minha perturbada cabeça de leitora, cismei que a história era atual até começar a me espantar com algumas referências, principalmente à facilidade de se arrumar um emprego. Bom, falha minha. O livro trata da época de 70, uma daquelas épocas que a gente sente saudade mesmo sem ter vivido, pelo romantismo dos cigarros que não eram ícones do câncer, da dignidade da profissão do redator (seja de propaganda ou de jornal), essas coisas que o progresso leva embora.
Mas nada disso tem a ver com a história.

Quando comecei a ler esse livro, pensei que uma leitura pode nos trazer o esperado, o inesperado ou as duas coisas.

“Desculpem, sou novo aqui” nos traz as duas coisas. O esperado quando se conta que um ex-padre vai começar a viver como uma pessoa mundana ( leia-se pessoa do mundo, sem tom pejorativo) é que ele seja alvo de piadinhas por parte dos colegas de trabalho, seja olhado como um allien por ter feito um voto de castidade, seja alvo de enorme curiosidade por parte de todos, pois padre muitas vezes nos parece alguém entre o ser humano e Deus. O personagem de Carlos Moraes passa por tudo isso, por todos os primeiros alguma coisa de uma vida (de novo) mundana, principalmente os códigos, os quais ele faz questão de repetir que não entende. Então, do alto da nossa experiência comum, sorrimos por dentro para reconhecer com quantos inúmeros e aparentemente indecifráveis códigos convivemos o tempo todo, desde uma buzinada ao motorista da frente, a um sorrisinho com segundas ou terceiras intenções.

Bom, visto o esperado, vêem as surpresas. Todas deliciosas. Talvez a melhor delas seja a matéria onde o ex-padre tem que dizer “jornalisticamente” quem foi Jesus Cristo. Se as declarações de amor a Deus podem ser feitas de muitas formas, o autor certamente nos mostra uma das mais originais e agradáveis. Ele fala ( me arrisco a dizer que há semelhança com a santíssima trindade) de três maneiras de ver Jesus, como se Ele de letra maiúscula pudesse na verdade ser muitas pessoas, pois cada um vê com seus próprios olhos, ou seja, à sua maneira.

Destaquei esse ponto, mas a obra não tem nada de religiosa ou tem tudo pra nos mostrar que não há coisa alguma que não seja religiosa. O próprio autor diz que suas grandes devoções são Jesus Cristo e o Corintians, então espere um pouco de futebol também.

Mas, sobretudo, espere rir muito, pois o texto de Carlos Moraes é brilhante. Fluindo tranqüilamente nos leva a verdadeiras gargalhadas com suas ironias e metáforas. Quer dizer que você não vai conseguir ler de uma vez só, pois vai ter de parar várias vezes para retomar o fôlego, seja por um aperto no peito, uma intensa risada ou uma gostosa cosquinha na alma.

E agora que eu já falei do esperado e do inesperado, tenha certeza que ainda sobrou muito pra você descobrir em “Desculpe, eu sou novo aqui”. Há mais coisas entre textos como esse e o leitor do que supõe nossa vã sabedoria. Pois Deus sabe o que faz, Carlos Moraes sabe o que escreve e quem não leu não sabe o que está perdendo.
Gisela Cesario

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